ADOLESCENTES COM CARACTERÍSTICAS  “DITAS” PROBLEMÁTICAS

Meninos e meninas que não são adultos, nem tão pouco crianças e que, por uma série de fatores, lutam literalmente, por seu espaço e reconhecimento na sociedade e que, apesar de lutar por um lugar-espaço comum, pretendem também, preservar a sua individualidade enquanto ser nesse mundo, e nesse conflito e guerra interior, o adolescente encontra-se muitas vezes, em fuga aos padrões considerados socialmente “normais”.

E é a partir dessa busca constante interna, que os mesmos, tendem a modificar o seu comportamento e as suas atitudes diante do mundo circundante e assim sendo, fogem aos padrões considerados normais e ganham o rótulo de adolescentes-problema ou com características problemáticas e que por muitas vezes se expressam, através da agressividade, como mais uma forma de ser “respeitado” por seu grupo social. E nesse processo, não pode-se considerar apenas que, este adolescente seja visto enquanto sujeito que apresenta-se como problema familiar ou social, sem avaliar e ponderar toda a contextualização advinda do desenvolvimento inerente ao processo como um todo em suas multifacetas.

 Nessa perspectiva, necessário se faz, refletir sobre as diferenças encontradas entre os adolescentes que apresentam esporadicamente agressividade a partir de uma resposta ao seu ambiente hostil e adolescentes que apresentam agressividade como resposta contínua as situações do cotidiano. Pretende-se entender esse processo, discorrendo a partir de seu conceito até a referência subjetiva da fragilidade inerente a este período da vida. 

Dias (2012), aponta que: Comportamentos como agressividade, desobediência e brigas podem ser percebidos pelos pais e professores ao longo do desenvolvimento normal da criança e do adolescente. Diante disso, uma avaliação aprofundada faz-se necessária para que seja possível diferenciar o patológico da normalidade. As formas como os comportamentos se apresentam e quais são os desvios das condutas esperadas para determinadas faixa-etária, gênero e cultura, são fundamentais para a precisão do diagnóstico, principalmente na infância (BORDIN,2000, Apud DIAS ,2012, p. 3).

Dias (2012), chama a atenção para um fato curioso, relacionado ao surgimento da agressividade no ser humano, em que evidências empíricas têm mostrado que a agressividade não é apenas desenvolvida quando o indivíduo entra na puberdade ou posteriormente, mas sim, já nos bebês, aproximadamente aos 18 meses, no comportamento relacionado a destruir objetos e agredir os pais Assim sendo, pode-se observar que os comportamentos agressivos podem apresentar-se muito cedo, a partir da infância e se estender pelos anos escolares expressando-se com maior veemência, na adolescência (KEENAN & SHAW (1998), Apud DIAS (2012).

Pode-se perceber que a agressividade em algumas pessoas não afloram na adolescência, mas apresentam-se desde a mais tenra idade da infância e que os pais, familiares, cuidadores e educadores, devem estar atentos a esse tipo de comportamento não só na adolescência, como também na infância, como forma de ajudar essas crianças no lidar cotidianamente, procurando minimizar as situações e episódios agressivos ou até mesmo,  fazerem os devidos encaminhamentos necessários ao diagnóstico precoce de problemas relacionados a conduta ou a algum tipo de doença mental, seja relacionada as questões físicas, neurológicas ou psicológicas.

 Nas situações de conflito que levam a agressão, inevitavelmente, estas exercem um papel devastador nas relações sociais e consequentemente, na aprendizagem. Por esse motivo, há uma preocupação constante com relação a forma de lidar com a questão desde a infância quando as crianças carecem de modelos pró-sociais. Para tomar como exemplo, o desemprego e a pouca perspectiva de um futuro estável e produtivo. O próprio bairro pode tornar-se um cenário de violência, quando a violência das gangues alastra-se na forma de conflito de território, criando formas de insegurança (BOCK apud SILVA, 2011).

Entende-se que o comportamento agressivo ou atípico com relação a maioria, está muito mais evidenciado quando o indivíduo entra na puberdade e logo após na adolescência. Acredita-se que porque esse período da vida, o sujeito encontra-se muito suscetível às influências do ambiente, sejam positivas, sejam negativas. Partindo do pressuposto de que o conceito de adolescência vem sendo descrito e compreendido a partir da cultura que o concebe, entende-se então, que a adolescência pode ser vista como um período de transição da infância à idade adulta e que envolve vários aspectos dos quais, são necessários para o desenvolvimento do indivíduo. Sendo assim, é uma fase de divergências e contestações aos padrões sociais tradicionais, turbulência física-biológica assim bem como, psicológica. Dessa forma, e por ser este um período de tensões e conflitos internos e externos, propicia ao jovem, a vulnerabilidade a instabilidade na sua forma de se comportar socialmente.

Conceitualmente, a adolescência é o período da vida que se situa entre a infância e a idade adulta, e inicia-se com as transformações da puberdade (por volta dos 11 anos) e termina com a entrada na vida adulta (por volta dos 20 anos), não estando o seu final claramente definido. Consiste também, numa fase de transição, na qual ocorrem transformações de carácter físico; social (mudanças na relação com os pais, amigos, sexo oposto); e psíquico (mudanças ao nível cognitivo e no modo de se ver a si próprio). São características desta etapa da vida: a maturação dos órgãos reprodutores; alterações no corpo, que o aproximam da forma que terá na vida adulta; a emergência do pensamento formal; uma maior autonomia face aos pais, comparativamente ao que acontecia na infância; o alargamento das relações sociais com os pares; alterações no relacionamento com o sexo oposto; a construção de projetos de carreira e de valores; e, finalmente, a construção de uma identidade positiva (MARTINS, 2005).

 Entende-se então que, pode-se perceber a adolescência a partir de dois aspectos: “Como um momento evolutivo do gênero humano que segue certos princípios gerais e como resultante de fatores socioculturais” (KNOBEL, 1981, p 40).

  E desse pressuposto pode-se constatar que, os fatores socioculturais influenciam os jovens, mas, existem determinantes psicológicos e biológicos também, que mostram-se fundamentais neste processo e que sempre caminharão com o adolescente em seu percurso à idade adulta. Existem muitos fatores relacionados ao desenvolvimento deste ou daquele comportamento no adolescente e neste caso, ao desenvolvimento de comportamentos agressivos. Esses fatores podem estar relacionados a muitos aspectos, a exemplo de sua personalidade, do ambiente familiar, social, problemas relacionados a psique ou doenças mentais, entre outros fatores, porém, é no seio da família, que o indivíduo aprende a ser e se relacionar com os outros seguimentos sociais de seu meio, aprendendo a lidar de forma coerente ou não com as situações da vida, a partir do que aprendeu com seus familiares e pessoas mais próximas, fato este que é inegável neste contexto.

Embora existam situações e dispositivos que propiciem as situações de reação agressiva no adolescente, elas por si só, não se justificam, pois, podem aparecer em algumas situações e em outras não, quando trata-se de situações de risco iminente para atitudes agressivas, principalmente, no âmbito familiar e escolar. Soma-se a isto, a falta de incentivo de valores morais e éticos, como respeito às diferenças e a solidariedade tão necessária para a formação do caráter dos indivíduos, e muitas vezes, são omitidos pelas escolas que se preocupam mais em passar conteúdo do que desenvolver cidadãos críticos capazes de transformar a realidade em que vivem e investir em uma vivência harmônica com os demais (SILVA, 2011).

Conforme dito anteriormente, as causas da conduta agressiva são influenciadas por múltiplos fatores além das causas relacionadas ao ambiente, estão também relacionadas aos fatores biológicos complexos:

Estes sistemas funcionam de forma integrada e harmônica, dessa forma, resultando, na expressão do comportamento agressivo compulsivo. Novas tecnologias vêm demonstrando estruturas cerebrais e genes envolvidos na mediação da agressão. De acordo com o avanço de tais técnicas, poderá ser possível, em um futuro próximo, um mapeamento mais completo dessas estruturas e do modo como influenciam a agressão. Contudo, deve-se ter a consciência de que não será apenas o excesso ou a falta de apenas uma, ou até mesmo várias substâncias do sistema nervoso central, que irá responder, de forma isolada, à complexa questão do comportamento violento (SANTOS et al, 2018, p. 9).

Sendo assim, faz-se necessário refletir sobre outras questões necessárias que podem tornar possíveis as diferenciações entre este ou aquele comportamento, como sendo importantes neste contexto, a exemplo da personalidade do sujeito, da empatia que o mesmo provoca ou sente pelo outro e por fim, das questões voltadas para a sua própria consciência de mundo, de sua visão e predisposição para partilhar a vida, compreender o outro em suas fragilidades e se perceber como ser social. Ao longo da história, muito se tem sido estudado e descoberto sobre o indivíduo e suas relações sociais no que concerne ao seu desenvolvimento, mas as bases fundamentais desses estudos e descobertas, sempre têm surgido a partir de referenciais que deram contribuições de suma importância ao conhecimento do ser humano (SANTOS, 2018).

 Os seres humanos, se diferenciam entre si de forma, indiscutivelmente, única e íntima. Cada um carrega em si, características que o fazem ser singular em um mundo de milhões e isso se deve ao fato, de serem seres distintos e donos do que conhece como personalidade, característica essa, inerente a cada indivíduo em particular. Dessa forma,  entende-se o que seja a personalidade e qual a importância da mesma, no lidar com o outro: Personalidade, do latim personalis, pessoal, é a soma de muitos caracteres diferentes e variáveis, intelectuais, afetivos e físicos, que confere a cada pessoa uma individualidade como uma semelhança a seus iguais. A personalidade significa a organização física, psíquica, social e cultural do indivíduo. Para o alemão Kempf, a “personalidade é representada pelo modo habitual de ajustamento que o organismo efetua entre as exigências individuais e as do ambiente” (MIELNIK, 1987, p. 208), Apud ARAÚJO, 2011, p. 1).

A partir desse entendimento, pode-se observar que, cada um tem uma personalidade individual, singular, com características que se evidenciam como ´sendo a sua própria identidade, que o faz ser quem é e a qual não existe ninguém com a sua mesma personalidade. Podem existir pessoas com características próximas ou parecidas, mas jamais com a mesma personalidade.

Porém, apesar de possuir personalidades diferenciadas, tem-se padrões, valores morais e culturais, regras e respeito mútuo para viver bem socialmente, mostrando que, as pessoas que fogem a esse padrão comportamental, seguem padrões intrínsecos ao seu próprio eu e que, via de regra, não concebem os padrões sociais como todas as outras pessoas as percebem, apontando assim inevitavelmente, para algum tipo de distúrbio ou confusão mental, requerendo dessa forma, uma melhor observação clínica a respeito.

A personalidade, identificada em traços inerentes e peculiares fazem parte de uma pessoa como ser único e peculiar, é o que o torna ser quem é, é a soma de várias peças individuais que forma o quebra cabeça intimamente do indivíduo. Dessa forma, pode-se referenciar como sua própria identidade, pois é ali, na personalidade, que identifica as pessoas como seres exclusivos e diferenciados dos demais. É a sua história contextualizada, é o seu histórico contado de maneira aberta ao outro social, nas relações sociais, no ser-com-o-outro, é o ser por si só, único. A palavra identidade acaba sendo utilizada no senso comum como sinônimo de personalidade (ARAÚJO, 2011).

 Assim sendo, as pessoas relacionam-se entre si a partir de suas semelhanças ou até mesmo, de suas diferenças, isso vai depender do contexto ao qual estão inseridas, porém, para relacionarem-se a nível de afeto, como pares, como amigos, colegas mais próximos, etc., necessário se faz, que exista o que socialmente, foi nomeado de empatia. Neste sentido, pode-se acrescentar que, para se viver em sociedade, são necessários dois pré-requisitos: a empatia e a consciência moral. Entendendo-se que a empatia é concebida como uma atitude necessária para se respeitar o posicionamento do outro diante das questões da vida, respeitando-o. É a partir da empatia que as pessoas se relacionam, se respeitam mutuamente e cooperam entre si (GOLEMAN, 2001, p. 282, Apud ARAÚJO, 2011).

Porém, a empatia por si só, não pode sustentar a obediência as normas sociais, pois estas se apresentam num panorama muito mais profundo e peculiar nas relações interpessoais. Enquanto a empatia contribui para o desenvolvimento de um comportamento altruísta, afetivo e moral, necessário se faz, a conscientização de determinadas normas sociais e de obediência a valores morais. Entende-se então, que as pessoas vivem em sociedade porque sentem empatia uma pelas outras num panorama geral e obedecem a normas e padrões construídos a partir dos valores respeitados pelas leis e ética na convivência umas entre si. E as pessoas têm essa percepção a partir de sua consciência, que se apresenta como um estado do aparelho psíquico, o qual faz com que as mesmas compreendam as pessoas e tudo o que as cerca (REY,1999, Apud ARAÚJO, 2011).

 Nesse contexto, soma-se a consciência, a moral, que é apresentada pela psicologia a partir de três aspectos importantes: julgamento moral (L. Kohlberg e J. Piaget); - conduta moral (R. Hogan); e - valores morais (H. J. Eysenck). O desenvolvimento do julgamento moral decorre, segundo a concepção da psicologia do desenvolvimento cognitivo (Kohlberg, em ligação com Piaget) em seis estágios: 1-orientação pelo castigo (obediência); 2- orientação egoísta-ingênua; 3- orientação pela aprovação social; 4-autoridade e ordem social; 5- orientação pelo contrato legal; e só então 6- orientação pela consciência moral, isto é, por princípios universalmente válidos. As dimensões da conduta moral são para Hogan: 1-conhecimento das regras morais; 2-socialização; 3-empatia com os outros; 4-autonomia (consciência versus responsabilidade) e 5-julgamento moral. (DORSCH; HÄCKER; STAPF, 2001, pp. 184-185, Apud ARAÚJO, 2011,p. 2).

Então, pode-se entender que necessário se faz a compreensão das normas e a associação delas ao cotidiano, para se viver e se relacionar bem e convencionalmente com o outro na mesma sociedade, mantendo respostas comportamentais aceitáveis e motivações internas, aos enfrentamentos do dia a dia.

A  partir dos estudos realizados que a personalidade se molda e se individualiza a cada fase, crescendo com o ser em desenvolvimento, mas a adolescência, por ser um período transitório e de difíceis enfrentamentos, tem um papel importante na “emolduração” da finalização da mesma. A fase da adolescência traz para o ser humano, um período de conflitos e busca de encontro consigo mesmo e com o outro. Pode tornar-se em um turbilhão de dificuldades, emoções, pensamentos e sentimentos que estão baseados nas questões biológicas (hormonais), físicas (relacionadas as mudanças na estrutura corpórea), sociais (nas relações consigo mesmo e com os outros), entre outros fatores relacionados a descoberta sexual, política, de classe social, etc. A partir desse contexto, pode-se entender os motivos pelos quais há uma tão difícil compreensão nas dificuldades relacionais humanas existentes, ocasionando em alguns, algo tão complexo e difícil.

Aos fatores biopsicossociais, pode-se eleger toda a responsabilidade relacionada aos comportamentos das pessoas, maneira de ver o outro, se relacionar nos grupos, a sua própria maneira de pensar, somando-se a isso, as características genéticas e o ambiente onde o sujeito está inserido, entre tantas outras questões.

A história da humanidade, mostra que o ser humano vai se construindo ao longo de sua existência, adquirindo pelo meio social e seus interesses, essas características como diferenças e referências de si mesmo, dessa forma, ele cresce, amadurece, se desenvolve, se torna ele mesmo. Essa construção vai se evidenciando através do processo natural inerente ao seu contexto social, interesses, religião, cultura, profissão, relações afetivas, a fase da vida em que se encontra (se criança, adolescente, adulto, idoso), entre outras questões intrínsecas e extrínsecas ao mesmo. Essas mudanças vão acontecendo ao longo da vida, porque as pessoas vão aprendendo umas com as outras, vão estudando, observando, refletindo, vivendo experiências positivas e negativas que produzem nelas mudanças que as tornam únicas no mundo (WACHOWICZ, 2011).

                                                                              Autora: Assirlene Xavier

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